Jindra Kraucher, Aldo Piedade Júnior e Beto Ribeiro foram os vencedores da 39a. Corrida Mil Milhas Chevrolet Absoluta, disputada no último fim de semana no Autódromo José Carlos Pace, em São Paulo, na categoria P1, principal da série do evento que marcou o início da temporada automobilística deste ano.
Eles pilotaram um automóvel Sigma P1, com motor Chevrolet, desenvolvido pela Sigma P1 Engenharia, conquistaram a pole position e lideraram de ponta a ponta a prova.
A Mil Milhas Brasileiras é a mais tradicional prova do nosso automobilismo, desde a década de 1950, e foi idealizada por Wilson Fittipaldi, radialista, jornalista, empresário e pai dos pilotos Emerson Fittipaldi e Wilson Fittipaldi Júnior.
Com sua paixão pelas corridas, além de idealizar a Mil Milhas Brasileiras, como homenagem à Mille Migla Italiana, também criou, em parceira com Eloy Gogliano, fundador do Centauro Motor Clube, outras importantes e tradicionais competições, como a 500 Quilômetros de Interlagos, realizada pelo anel externo da pista, trazendo para o Brasil as emoções de Indianápolis, nos Estados Unidos, e a 24 Horas de Interlagos, nos moldes da francesa 24 Horas de Le Mans.
E foi justamente em uma das primeiras Mil Milhas Brasileiras, a do ano de 1958, que Wilson Fittipaldi entrevistou o gaúcho Catharino Andreatta e, ao perguntar sobre a importância da corrida para ele, recebeu como resposta uma simpática gozação de agradecimento aos paulistas pela bondade de organizar corridas para os gaúchos vencerem.
Os gaúchos ganharam as primeiras Mil Milhas Brasileiras dos anos de 1956 e 1959 e foram pioneiros na criação da categoria de carreteras (principalmente automóveis Ford e Chevrolet), que recebiam motor Corvette e Ford de elevada potência, utilizadas pelos argentinos em corridas de estrada sem pavimentação.
Os pilotos Catharino Andreatta e Breno Fornari conquistaram três vitórias, até que em 1960 Chico Landi e Christian Heinz encerram o domínio gaúcho em 1960, na condução de um FNM 2000.
A Mil Milhas conquistou o coração dos brasileiros desde as primeiras edições. Tem uma inexplicável magia e causa forte emoção aos pilotos e aficionados por corridas. Talvez seja pela variedade de carros e marcas, estilo, motores, equipes e profissionais superespecializados, que passam noites seguidas sem dormir ou noites mal dormidas para que, nas pistas, alcancem o melhor desempenho.
Tudo na Mil Milhas desperta forte paixão e relato apenas o que considero um emocionante exemplo desse sentimento. Em 1966, a Vemag encerrou as suas atividades esportivas e provocou profunda decepção aos pilotos, mecânicos e até aos gerentes que cuidavam da área de competições.
Mas um grupo de pilotos e mecânicos da ex-Vemag decidiu tentar participar da Mil Milhas e pediu ajuda aos diretores da Lumimari, fábrica de automóveis Puma, que os ajudasse a conseguir o empréstimo dos carros guardados na fábrica para participarem da Mil Milhas.
Com a ajuda do engenheiro Otto Kutner, a Lumimari conseguiu a cessão dos carros, componentes, ferramentas e o grupo assumiu as despesas necessárias para a corrida, como combustível, pneus e alimentação entre outras.
A equipe foi identificada com o nome de Brasil, que inscreveu dois Malzoni com motor de 1.100 cm³ para a dupla Mario César de Camargo Filho e Eduardo Scuracchio e Norman Casari e Carlos Erimá; um Malzoni com motor de 1.000 cm³, para Emerson Fittipaldi e Jan Balder, além de duas carreteras DKW-Vemag. Uma com distância entreeixos reduzida com o nome de Mickey Mouse, para os pilotos Flodoaldo Arouca – Volante 13 – e Walter Hahn Jr. e o carro com entreeixos normal, para Roberto Dal Pont e Pedro Victor DeLamare.
Além dos carros, os pilotos também receberam ferramentas, peças, pneus e equipamentos e convidaram Miguel Crispim, ex-chefe dos mecânicos da extinta equipe de competição, para chefiar o novo grupo.
Foi a corrida mais dramática para os pilotos da equipe Brasil. Sem apoio financeiro, levaram os três Malzoni ao segundo, terceiro e quarto lugares, com motores de apenas 1.000 e 1.100 centímetros cúbicos de cilindrada e quase chegaram à vitória contra veículos mais modernos e equipados com motores mais potentes.
Desde a largada, a disputa foi eletrizante, porque os motores Vemag de dois tempos, que exigiam a mistura de óleo à gasolina, não funcionaram pelo decantamento da mistura o que exigiu dos mecânicos balançar os carros para que ocorresse a mistura necessária para o funcionamento. Com isso, os pilotos precisaram recuperar o tempo perdido.
Os carrinhos foram ganhando posições e chegaram às últimas 20 voltas ocupando as três primeiras posições para delírio da equipe. A carretera de Camilo Cristófaro e Eduardo Celidônio era o adversário mais próximo, em quarto lugar.
Faltando seis voltas, o carro de Emerson e Balder, que liderava a corrida passou a funcionar com apenas dois cilindros. E sob a condução de Celidônio, a carretera começou a ultrapassar os carrinhos Vemag.
Para quebrar corações, Jan Balder causou surpresa ao levar o carro ao box para tentar reparar o problema mecânico. Presente nos boxes, Bob Sharp, amigo de todos, calculou que se Balder não parasse para corrigir o problema seria possível manter o Malzoni na liderança.
Essa parada, resultado do nervosismo da equipe, foi fatal. A carretera de Camillo Christófaro e Celidônio, mesmo parando nos boxes mais uma vez para reabastecimento, ultrapassou o Malzoni comprometido com o problema no motor.
O sentimento de decepção e tristeza tomou conta da equipe Brasil, contrastando com as comemorações no box da equipe de Camillo e Celidônio.
Apesar do triste final, a atuação dos pilotos da equipe Brasil foi excepcional e proporcionou à Mil Milhas um final de muita emoção. Camilo e Celidònio foram levados ao pódio nos ombros da equipe e Emerson e Jan Balder, dois meninos ainda, choravam pela derrota, mesmo com uma atuação de campeões.
No pódio, ao notar a decepção de Emerson, Camilo o acariciou e disse que ele venceria muitas corridas no futuro, o que, de fato, aconteceu.
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Crédito das imagens: Racemotor e Arquivo Internet